quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Cana-de-açucar, fonte de água

Os critérios de sustentabilidade e a legislação ambiental que cercam a atividade canavieira estão forçando a indústria a desenvolver tecnologias que envolvem cada vez mais a preservação dos recursos naturais, criando ciclos de renovação naturais diante da gigantesca produção sucroalcooleira. Primeiro, criaram-se meios para evitar contaminações do solo e das águas, e dessa forma a vinhaça ganhou um novo conceito transformando-se em fertilizante para a lavoura de cana. Posteriormente, surgiram outras vias sustentáveis para aproveitar quase 100% da matéria-prima, tornando a palha e o bagaço da cana, por exemplo, recursos “de ouro” para a produção de energia elétrica. Agora, a indústria dá mais um passo rumo a este novo conceito industrial e sustentável ao lançar a “Água de Cana” ou “Água Doce”.

A novidade foi lançada em agosto e deve estar totalmente disponível para o mercado em 2009. Trata-se de uma tecnologia capaz de tornar uma usina auto-suficiente em água, ou melhor, uma usina que não precisa lançar mão de mananciais, tirando da própria cana-de-açúcar a água necessária para seus processos industriais (isso é possível porque a cana tem 70% de água em sua composição). Mas o que se espera, além da auto-sustentabilidade hídrica, é que em um futuro bem próximo, os ajustes feitos a essa tecnologia possibilitem às usinas, o fornecimento de água industrial, agrícola e até potável ao mercado.

José Luiz Olivério, vice-presidente de tecnologia e desenvolvimento da Dedini Indústria de Base, inventora do processo, adiantou que o sistema, na realidade, apresenta duas soluções para o mercado: “Já temos condições de fornecer usinas auto-sustentáveis em água e, em um segundo momento, transformar a usina em uma exportadora de água. Assim, a água será mais um produto obtido da cana, como a bioeletricidade”, explica.

Consumo de água

Dados do CTC (Centro de Tecnologia Canavieira) apontam que o consumo de água por parte das usinas de açúcar e etanol vem diminuindo significativamente nos últimos 20 anos. Em 1988, calculava-se um consumo de 5,6 mil litros de água por tonelada de cana. Hoje, as usinas usam 1,8 mil litros de água por tonelada. Com a nova tecnologia, a tendência é chegar a zero e ainda, produzir água excedente para comercialização.

O sistema foi apresentado pela Dedini nestas duas etapas: a usina auto-sustentável (aproveitamento máximo da composição hídrica da cana para o processo industrial) e a usina fornecedora de água, que através do sistema de evaporação da vinhaça concentrada (65%), consegue obter a “água doce” para uso industrial, agrícola (irrigação) e doméstico. Com esta tecnologia, ele garante que seria possível produzir 300 litros de água por tonelada de cana, o que representa, em uma usina com capacidade para 12 mil toneladas de cana/dia, a produção de 3,6 milhões de litros de água por dia.

Subprodutos do bem

O desenvolvimento destes novos produtos proporcionou à indústria chegar a um terceiro subproduto da cana-de-açúcar, igualmente amigo do meio ambiente, o Biofom. “A mesma tecnologia que permite o melhor aproveitamento da água no ciclo de processamento da cana, permitiu o desenvolvimento de um biofertilizante que foi batizado de Biofom, que pode substituir o fertilizante químico que vem do petróleo”, esclarece o executivo.

O Biofom é um biofertilizante organomineral feito a partir da mistura da cinza da caldeira, da torta de filtro, fuligem de chaminé e da vinhaça concentrada (todos subprodutos da fabricação do açúcar e do etanol) adicionado de fertilizantes minerais de acordo com as necessidades da cana e da soqueira. A indústria defende que o Biofom, em substituição à vinhaça, é mais vantajoso porque aumenta a produtividade da lavoura e reduz em 20% os gastos com transporte (consumo de combustível). De acordo com Olivério, o Biofom tem 90% de carga fertilizante, enquanto a vinhaça tem 10%. Ele diz ainda que o produto possui maior facilidade em atender à legislação ambiental, pois evita a perda de nutrientes do solo por lixiviação, substitui em parte o uso de fertilizantes minerais e elimina o mau cheiro da vinhaça.

Em sua opinião, a produção do Biofom pode representar uma grande revolução, já que o produto representa a utilização racional e econômica de todos os subprodutos produzidos na indústria sucroalcooleira e isso, por si só, minimiza o impacto ambiental de sua utilização in natura, além de poder permitir a redução das dosagens de nutrientes adicionadas na cultura canavieira, uma vez que ele combina a fertilização orgânica com a mineral, ou seja, mistura onde os nutrientes são potencializados.

Água mineral

Introduzir no mercado a tecnologia verde para um melhor aproveitamento de água é o objetivo principal da empresa, mas expandir os sub-produtos melhorados tecnologicamente também faz parte das intenções e, por isso, José Luiz Olivério não descarta a possibilidade de, em pouco tempo, usinas de etanol estarem atuando no setor de produção de água potável. “Esta possibilidade não está descartada e tem uma qualidade adicional: será uma água orgânica”, diz ele. “É uma água recuperada da cana, mas evidentemente que ainda será necessário realizar um profundo estudo de viabilidade e um plano de negócios para tomar essa decisão”.

Viviane Taguchi
Fonte: Revista Energia Mundo

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