A ONU irá propor a criação de uma série de critérios técnicos para a produção dos biocombustíveis. O objetivo é tentar diminuir a polêmica em relação à questão do etanol e seu impacto nos preços dos alimentos. O Brasil está no centro da polêmica e é acusado por países da Europa de prejudicar a produção de grãos por causa do biocombustível.
Antecipando-se à própria ONU, um grupo de pequenos produtores, alguns deles da agricultura familiar, uniu-se a uma usina de cana-de-açúcar no interior de São Paulo para produzir álcool e etanol certificados. A experiência inovadora e piloto acontece na região de Bariri, a 321 quilômetros de São Paulo.
Cerca de 50 produtores de cana-de-açúcar e a Usina Della Coletta assinaram um protocolo socioambiental e contrataram a Organização Internacional Agropecuária (OIA) para desenvolver uma certificação própria para o produto. As normas entraram em vigor no dia 30 de agosto. Eles devem produzir cerca de 260 mil toneladas de cana certificada por ano.
"Queremos ter um produto com total rastreabilidade, a partir de cana para sementeira até o produto final. Nós acreditamos que há um mercado para este tipo de produto, principalmente na Europa", disse Fernando Cesar Gregorio, presidente da Associação dos Fornecedores de Cana da Região de Bariri (Assobari), em entrevista recente à Agência de Notícias Reuters e publicada no 'The Guardian', um dos mais importantes jornais da Inglaterra.
O Sebrae em São Paulo é parceiro dessa iniciativa. Em um primeiro momento vai capacitar 50 produtores e também integrantes da Associação para que no futuro possam repassar a metodologia a outros produtores de forma autônoma, sem depender do Sebrae. Essa parceria da Instituição com os produtores de cana e usineiros é inédita no setor de agroenergia.
Para o coordenador da carteira de agroenergia da Instituição em São Paulo, José Carlos Gomes dos Reis Filho, o objetivo é fazer com que os produtores possam chegar aos termos determinados pelo protocolo. Entre os critérios que serão levados em conta estão o social, o sistema de produção, a responsabilidade social e ambiental, entre outros.
Isso significa dizer que os produtores devem recusar o uso de trabalho escravo ou infantil, limitar o uso de agroquímicos e recolher a cana com ceifeiras mecânicas e não manualmente. O corte manual envolve queima da folhagem.
Essas regras são uma preocupação da ONU. Segundo o relator das Nações Unidas para a Alimentação, Olivier de Schutter, os critérios propostos aos países pela Organização devem incluir não apenas questões de preços de alimentos, mas aspectos relacionados ao meio ambiente e às condições de trabalho. Para ele, a exploração é freqüente nas grandes plantações da indústria de biocombustíveis.
A parceria na certificação começou no início do ano. Um diagnóstico elaborado pelo Sebrae para checar a distância que os produtores estavam dos critérios revelou uma surpresa: a maioria está muito perto das exigências. "Não teremos dificuldade com os produtores", acredita Reis. Segundo ele, um sistema de gestão de qualidade das normas será implantado. "Queremos que a associação faça a fiscalização sobre a aplicação das normas. Além disso, qualquer outra norma técnica poderá ser rapidamente implantada pela própria associação".
Reis explica também que uma das preocupações é em relação ao sistema de cadeia de custódia, onde a usina será obrigada a vender com o selo apenas álcool e etanol de cana certificada. "Eles podem comprar e vender o álcool que quiserem, mas o certificado deverá ter procedência da cana certificada”.
Uma das vantagens do projeto, segundo o coordenador de agroenergia, é o comprometimento da usina em repassar aos produtores uma porcentagem do valor agregado na venda. "Como ninguém sabe ainda o quanto a certificação vai agregar no preço, a margem ainda será negociada".
A Assobari conta com 300 associados e o processo deverá ser estendido a todos os produtores. Atualmente o Estado de São Paulo possui 13 mil pequenos fornecedores de cana, que respondem por 25% da cana moída no Estado.
Proliferação
O governo de São Paulo está preocupado com o forte avanço da cana-de-açúcar no Estado e decidiu endurecer as regras para instalação de novas usinas ou ampliação das já existentes. Segundo a Secretaria do Meio Ambiente, o espaço ocupado por lavouras de cana no território paulista corresponde a quase 70% da área plantada, excluindo as pastagens.
Considerando o total de 1,2 milhões de hectares previstos nos 31 empreendimentos aprovados ou em fase de aprovação no governo, a área com cana deve passar dos atuais 4,9 milhões de hectares para 6 milhões de hectares em 2010. O Estado tem 19 milhões de hectares de terras agricultáveis, dos quais 9 milhões são ocupados por pastagens. Também responde por mais de 60% de toda a cana produzida no País e algumas regiões já se encontram saturadas por canaviais.
0 levantamento do governo paulista, que os técnicos chamam de zoneamento agroambiental da cana-de-açúcar, vai resultar em um mapa de São Paulo dividido por bacias hidrográficas pintadas nas cores verde, amarela e vermelho. O verde significará que a região não apresenta restrições e o processo de licenciamento de novas usinas ou ampliações seguirá as regras atuais. No sinal amarelo, as exigências serão bem mais rigorosas. Já no vermelho, não serão concedidas licenças.
Para elaborar o novo zoneamento, além do tradicional levantamento de aptidão de solo e clima e do nível de concentração dos canaviais, os técnicos levaram em conta aspectos ambientais. Haverá restrições, por exemplo, em áreas cujos recursos hídricos já estão comprometidos por causa do uso de irrigação por meio de processos mecânicos.
O recebimento de pedidos de licenças para novas usinas e para expansões das já existentes, que está suspenso desde meados do mês de maio, será retomado no dia 18 de setembro, quanto as novas regras já estarão em vigor.
A intenção do governo paulista de estabelecer restrições foi recebida com preocupação pela Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo (Ocesp). O presidente Edivaldo Del Grande disse "ser contrário ao cerceamento do cultivo da cana no estado". Para ele, o que se deveria buscar é o "zoneamento técnico", com indicação das regiões mais apropriadas a determinadas culturas.
Del Grande afirma que "o governo paulista deve ter bom senso. Se o objetivo é diversificar as culturas e valorizar o cultivo de alimentos, é preciso criar mecanismos para garantir a renda do produtor rural. O produtor, sempre penalizado com as crises cíclicas no campo, opta pelas atividades que proporcionam maior renda. Apenas restringir a expansão da cana-de-açúcar apresenta-se como algo arbitrário e preocupante".
Fonte: Agência SEBRAE
Do:
sexta-feira, 24 de outubro de 2008
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